Continuo com meu vício em Jane Austen e andei achando muita coisa legal por aí.
No JASNA por exemplo, tem uma série de artigos interessantes que falam de tudo sobre as obras dela... Tem textos analisando cada detalhe... tem até análise psicológica de Darcy e Lizzy segundo Jung! Tem texto explicando porque o filme Become Jane é nada a ver, falando sobre o monte de besteirinhas colecionaveis para os fãs nerds da Jane... enfim, uma porrada de coisa que vale a pena ler.
Tem alguns que eu achei mais interessantes e resolvi traduzir. Não sou grande tradutora, nem sei se ficou grande coisa, mas acredito que será útil para quem tem o inglês mais limitado que o meu.
Esse primeiro fala sobre o papel do riso em Orgulho e Preconceito. É muito interessante! ^__^
Elizabeth usando uma tática milenar que eu tb já usei muito: compartilhar
sua vergonha para se sair bem da história hahaha
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Rindo de Mr. Darcy: inteligência e sexualidade em
Orgulho e Preconceito
Escrito por Elvira Casal
Elvira Casal (email: ecasal@frank.mtsu.edu) leciona inglês na Universidade do Tennessee em Murfreesboro.
Traduzido por lina inverse
O texto em inglês pode ser lido aqui
Bem no início de Orgulho e Preconceito, Miss Bingley diz que jamais poderia caçoar ou rir de Mr. Darcy: “Caçoar de serenidade de temperamento e presença de espírito! Não, não – Acho que ele pode nos desafiar nessa área. E quanto a rir, não vamos nos expor ao ridículo de rir sem motivo.” A resposta de Elizabeth é significativa: “’Não é possível rir de Mr. Darcy!’ exclamou Elizabeth. ‘Essa é uma qualidade incomum, e espero que continue a ser incomum, pois seria muito triste para mim conhecer muitas pessoas que a possuam. Gosto muito de rir.’”
Implícito na afirmação de Miss Bingley que não se pode rir de Mr. Darcy está o reconhecimento da superioridade social e intelectual do mesmo. Implícito na declaração de Elizabeth de que gosta muito de rir, está não somente a recusa em ser impressionada pela superioridade de Mr. Darcy, como também sua crença no poder do riso.
O papel do riso em Orgulho e Preconceito é muito interessante. Por um lado, o romance parece ser uma celebração ao riso. Desde a famosa primeira sentença, o leitor é convidado a rir das ironias e das expectativas da percepção humana. Por outro lado, o enredo da história parece mostrar as limitações do riso como resposta à experiência humana. O riso de Mr. Bennet está intimamente ligado a sua abdicação da responsabilidade, e a personagem que mais ri é a Lydia.
No fim do livro, quando Elizabeth escreve para sua tia, “Estou até mesmo mais feliz do que a Jane; ela somente sorri, eu rio”, o riso de Elizabeth deixou de ser um riso de diversão e passou a ser um riso de satisfação. No processo ela se confrontou com fatos nada risíveis, como os defeitos de seus pais, a fuga de Lydia e por fim, sua própria vulnerabilidade como mulher em uma sociedade patriarcal.
Ela teve que rever sua opinião sobre o Mr. Darcy e admitir a si mesma que gostaria de ser desposada por ele. Entretanto, ela não deixou de achar que Mr. Darcy, assim como todo mundo, às vezes pode ser objeto de riso. Nas últimas páginas vemos a surpresa de Georgiana Darcy em relação ao modo “animado e brincalhão” no qual Elizabeth se dirige a ele. Mas o que “rir de Mr. Darcy” significa para Elizabeth?
Um modo de ver o papel do riso em Orgulho e Preconceito, é que no decorrer da história Darcy tem que aprender a aceitar o riso, enquanto Elizabeth tem que aprender a rir com prudência. Mas o papel do riso no relacionamento dos dois é um pouco mais complicado. Uma leitura atenta nos mostra que Darcy não é tão mal humorado e moderado quanto aparenta ser. Ele pode não rir, mas a seu modo, ele é tão chegado à ironia e a incongruência quanto Elizabeth. Podemos interpretar também, que o riso está ligado à tensão sexual entre diferentes personagens. Além disso, o riso de Elizabeth, sua agradável perspicácia e energia que a faz tão atraente aos leitores modernos teria chocado alguns contemporâneos de Jane Austen e certamente era de se esperar que chocasse Mr. Darcy.
Um modo de ver o papel do riso em Orgulho e Preconceito, é que no decorrer da história Darcy tem que aprender a aceitar o riso, enquanto Elizabeth tem que aprender a rir com prudência. Mas o papel do riso no relacionamento dos dois é um pouco mais complicado. Uma leitura atenta nos mostra que Darcy não é tão mal humorado e moderado quanto aparenta ser. Ele pode não rir, mas a seu modo, ele é tão chegado à ironia e a incongruência quanto Elizabeth. Podemos interpretar também, que o riso está ligado à tensão sexual entre diferentes personagens. Além disso, o riso de Elizabeth, sua agradável perspicácia e energia que a faz tão atraente aos leitores modernos teria chocado alguns contemporâneos de Jane Austen e certamente era de se esperar que chocasse Mr. Darcy.
Naquela época, a reação ao riso das mulheres era bem diferente de hoje em dia. Muitos contemporâneos de Jane Austen – tanto homens quanto mulheres – viam o riso como algo vulgar. Como o riso era ligado à irreverência para com a autoridade e à falta de autocontrole, até mesmo os homens eram desencorajados a rir. O riso da mulher particularmente, era associado por um lado, à tolice, e por outro, à agressividade inapropriada. De qualquer maneira, para uma mulher, rir demais era indelicado.
Um pouco de zombaria e de escárnio bem humorado fazia parte da relação social, mas o riso que provinha da sagacidade era suspeito nas mulheres. Ao contrário do riso gentil ou benevolente associado com o “humor”, o riso da “perspicácia” era agressivo. Perspicácia implica em senso crítico. Ao rir prontamente do que ela chama de “tolices e absurdos, manias e inconsistências” dos que a cercam, Elizabeth está desafiando a convenção social que liga feminilidade à passividade.
Além disso, através de uma complicada série de associações, no século XVIII e também no XIX, a perspicácia na mulher era constantemente ligada à liberdade sexual. Uma explicação possível para essa associação é que a sagacidade é ligada ao poder e à agressividade. Outra seria que a pureza da mulher dependia do respeito pela autoridade masculina.
Quando Mr. Bennet alerta Elizabeth para que não se case com Mr. Darcy pelo dinheiro, ele diz: “sei que você não poderia ser nem feliz, nem respeitável a menos que estimasse verdadeiramente seu marido... sua vivacidade iria colocá-la em grande perigo em um casamento desigual. Dificilmente você escaparia da desonra e da miséria.” A vivacidade de uma mulher em ver as “tolices e absurdos, manias e inconsistências” dos que a cercam, pode fazê-la não ter respeito por seu parceiro, e isso poderia levá-la a um comportamento impróprio. Apesar do aviso de Mr. Bennet não querer dizer mais do que a possibilidade de Elizabeth se tornar uma megera que caçoa de seu marido em público, a escolha das palavras “respeitável” e “desonra” sugerem uma conotação sexual. Em outras palavras, o fato de Elizabeth gostar de rir não era apenas, pelas regras de sua sociedade, atrevido e potencialmente subversivo como também tinha uma carga sexual. A mulher que muito ri poderia ser também a mulher de sexualidade descontrolada cuja liberdade verbal estava ligada à imoralidade e ao desejo físico.
Não é coincidência que dentre todas as personagens de Orgulho e Preconceito, a que mais ri é também a que transgride sexualmente. O riso de Lydia Bennet é sinal tanto de sua tolice – falta de reflexão – quanto de uma sexualidade desenfreada. Isso é mostrado claramente na carta que ela deixa quando foge:
“Como você vai rir quando souber para onde fui, eu mesma não consigo parar de rir ao pensar na surpresa que terão amanhã de manhã, quando perceberem que sumi. Vou para Gretna Green, e se você não adivinhar com quem, devo achá-la uma tola, pois amo somente um homem nesse mundo, e ele é um anjo. Nunca seria feliz sem ele, por isso não vejo mal em partir. Se não quiser não precisa avisar em Longbourn sobre minha partida, pois assim eu os surpreenderia ainda mais quando escrever para eles assinando como Lydia Wickham. Mas que piada ótima seria! Estou rindo tanto que mal consigo escrever...”
Para Lydia, fugir com um homem é uma grande piada. A carta não demonstra qualquer arrependimento, nenhuma sensibilidade à dimensão moral do que está fazendo, nem mesmo a consciência de que sua fuga possa causar problemas ou desapontamento aos amigos e familiares – demonstra somente deleite ao realizar seu desejo. “Indomável, desavergonhada, descontrolada, barulhenta e destemida.” Lydia vive impensadamente, fugindo com um homem que não pretende se casar com ela somente por achar “muito divertido” casar-se antes de suas irmãs.
Embora o gosto ao riso de Elizabeth seja claramente diferente do de Lydia, a presença de sua irmã descontrolada, inconseqüente e sexualmente precoce, nos diz algo sobre Elizabeth e seu riso. Basicamente, Lydia serve para dar realce às atitudes da irmã. Existem muitas semelhanças entre elas: assim como Elizabeth, Lydia ama rir, é a favorita de um de seus pais e nem sempre dá atenção às regras. Assim como Elizabeth, ela se sente atraída por Wickham. Acabando as semelhanças, o leitor geralmente é levado pelos contrastes. Mas o único contraste que realmente importa é que Elizabeth reflete e pondera. Se o gosto ao riso de Lydia está implicitamente ligado à sexualidade, podemos assumir que o dela também, porém esta lidará com sua sexualidade com muita reflexão e discernimento.
Durante todo o livro, a tensão sexual entre Elizabeth e Mr. Darcy é evidenciada numa série de diálogos inteligentes, onde o riso dela se contrapõe à seriedade dele. Uma dessas primeiras situações ocorre no trecho citado no início desse texto onde Elizabeth responde com deleite à sugestão de Miss Bingley de que “não é possível rir de Mr. Darcy.” Para Elizabeth, só a idéia de alguém ser, de alguma forma impassível ao riso já é risível. Quando Darcy responde: “Até o melhor e mais sábio dos homens, e mesmo a melhor e mais sábia das ações, pode ser ridicularizada por alguém que faz de seu objetivo na vida o escárnio” , Elizabeth aponta que não é uma dessas pessoas: “eu espero nunca ridicularizar o que é sábio e bom” e continua a confrontar Mr. Darcy sugerindo que ele acredita não ter defeitos como “tolices e absurdos, manias e inconsistências”. Infelizmente, é o que ele realmente parece pensar. Ele admite que tem defeitos - “Meu temperamento talvez possa ser chamado de rancoroso.” – Mas seus defeitos, ele conclui, não são engraçados. Elizabeth concorda, mas não sem ironia: “Ressentimento implacável é uma falha de caráter. Mas você escolheu bem seu defeito – realmente não posso rir dele; de mim você está a salvo.”
Esse diálogo é importante, pois demonstra o que o riso significa para ambos. Neste ponto da história, Darcy vê o riso como falta de respeito. Já Elizabeth, que foi criada por um pai cuja filosofia é “vivemos para servir de piada aos vizinhos e para nos rirmos deles em nossa vez”, liga o riso à intimidade. Quando ela diz que não pode rir do defeito de Mr. Darcy, ela não está sugerindo apenas que “ressentimento implacável” não é risível, mas também expressando sua falta de interesse em se aproximar dele.
Aparentemente, Mr. Darcy e Elizabeth parecem ser muito diferentes não apenas em termos de gênero e posição social, mas na essência de suas atitudes diante da situação. Elizabeth é divertida; Mr. Darcy é sério. Ela está tentando fazer uma piada para provocar. Ele está tentando, seriamente, se explicar: “Existe, creio eu, em todo temperamento uma tendência a algo ruim, um defeito natural, ao qual nem mesmo a melhor educação pode superar.” E quando ela tenta desfazer de sua séria colocação de forma petulante, “E o seu defeito é a tendência a odiar todo mundo”, ele está pronto para ela: “’E o seu’, respondeu ele com um sorriso, ‘é o de se recusar a compreender os outros.’”
Seu sorriso é tão importante quanto o riso de Elizabeth. Nunca o vemos rir, mas seus sorrisos – que geralmente aparecerem em seus diálogos com Elizabeth – demonstra um pensamento rápido como o dela e a crescente receptividade ao seu amor pelo riso.
Inicialmente a atração que Elizabeth sente por ele é física, mas é também a uma atração física que está ligada a admiração que Darcy sente por sua personalidade.
Ele fica fascinado pela “bela expressão de seus olhos escuros” e pela “inteligência” que eles dão ao seu rosto. Contra sua vontade ele descobre que seus traços são “leves e agradáveis” e é atraído por sua “naturalidade”.
Ao confessar essa atração justamente para Miss Bingley, ele mostra também um pouco de jocosidade de sua parte.
A interação de Darcy com Miss Bingley geralmente é negligenciada pelos leitores, pois parece de pouca importância para a real questão do relacionamento dele com Elizabeth. Mas é nessa interação que temos uma amostra do verdadeiro Darcy. As conversas entre os dois nos mostram que ele pode ser tão perspicaz quanto Elizabeth Bennet. Por exemplo, quando Miss Bingley acusa Elizabeth de ser “uma dessas jovens que tentam recomendar a si mesmas ao sexo oposto, através da desvalorização de seu próprio,” Mr. Darcy responde ironicamente: “existe maldade em todas as artes que as damas às vezes condescendem em empregar para cativar”. Sua resposta indica que ele vê as intenções de Miss Bingley de se “recomendar” a ele “desvalorizando” Elizabeth.
Um ponto importante sobre o relacionamento de Mr. Darcy com Miss Bingley é que, embora ela afirme que não poderia jamais “rir de Mr. Darcy”, ela está na verdade, caçoando dele desde que este confessou sua admiração pelos olhos de Elizabeth.
Um ponto importante sobre o relacionamento de Mr. Darcy com Miss Bingley é que, embora ela afirme que não poderia jamais “rir de Mr. Darcy”, ela está na verdade, caçoando dele desde que este confessou sua admiração pelos olhos de Elizabeth.
Boa parte de seu riso se encaixa na categoria de zombaria social e também é uma forma de flerte. Entretanto, a zombaria de Miss Bingley tem também o propósito de tentar envergonhar Darcy pelo seu interesse em Elizabeth. O tempo todo ela caçoa de seu interesse enfatizando as conexões inferiores e falta de maneiras da família da Elizabeth: “Terá uma adorável sogra e naturalmente ela estará sempre com você em Pemberley”, “temo que essa aventura tenha afetado sua admiração pelos seus belos olhos”, e “coloque os retratos de seu tio e tia Philips na galeria de Pemberley”.
O riso de Miss Bingley é sutilmente agressivo; ela usa de zombaria para afirmar sua própria superioridade e tenta influenciar as ações dos outros através de seu escárnio. Mesmo não sendo bem sucedida com Mr. Darcy, o riso de Miss Bingley representa a perspectiva da “sociedade refinada”, o grau em que o riso irônico é socialmente permitido, e o julgamento superficial que ele reflete. Se no início do livro Mr. Darcy desconfia do riso, não é somente porque seu conhecimento aristocrático o leva a associar o riso com irreverência, tolice e sexualidade descontrolada – como representada pela Lydia – mas também por causa de sua experiência social que o ensinou a conectar o riso à malícia superficial que Miss Bingley exibe.
Miss Bingley também serve para realçar Elizabeth. Assim como no caso da Lydia, as diferenças entre elas são mais visíveis, mas as semelhanças, talvez mais interessantes. Ambas, de maneira diferente, sentem atração por Darcy. Ambas podem ser perspicazes – Elizabeth fica surpresa em ver que, quando não há homens presente, as irmãs Bingley “eram capazes de descrever um acontecimento com exatidão, contar uma anedota com humor e rir espirituosamente dos conhecidos”. Ambas são atentas aos nuances da sociedade e críticas para com aqueles que não seguem seus padrões. A principal diferença, além da maior individualidade de julgamento de Elizabeth, parece ser sua falta de malícia. Mesmo os absurdos de Mr. Collins ou a arrogância de Lady Catherine não provocam em Elizabeth comentários maldosos do tipo que Miss Bingley sempre faz sobre as conexões das irmãs Bennet.
A tensão sexual contida nas entrelinhas dos diálogos de Darcy com Miss Bingley existe para realçar o contraste com a tensão entre ele e Elizabeth, não apenas porque Miss Bingley está tentando conquistá-lo enquanto Elizabeth demonstra sua indiferença, mas porque elas empregam o riso de modo diferente.
O riso de Miss Bingley a distancia de seus ouvintes, mesmo quando a intenção é oposta. Mr. Darcy pode até concordar que o comportamento da família Bennet é impróprio e até se junta a Miss Bingley nas críticas, mas ele não parece se juntar ao seu riso. Para ela, o riso é uma arma, um modo de impor seu ponto de vista aos outros. Para Elizabeth, o riso é um convite à camaradagem. Como ela conecta o riso compartilhado à intimidade, ela o usa para se aproximar dos que estão ao redor.
Podemos ver como Elizabeth usa o riso para se aproximar dos outros ao analisarmos sua reação quando Mr. Darcy se recusa a tirá-la para dançar dizendo que ela “não é bonita o bastante para me tentar”. A principio, sua decisão de “contar o ocorrido... para seus amigos com muito bom humor” parece não ter muito sentido. Por que contar aos outros sobre um fracasso? Se ela não tivesse contato o que ocorreu, ninguém ficaria sabendo e ela teria evitado as piadas ( “Tive mais sorte nas conversas que ouvi do que você, Eliza” diz Charlotte Lucas. “Pobre Eliza! – ser apenas tolerável”) e todas as demais fofocas de vizinhos como Mrs. Long.
Entretanto, o que ocorre é que Elizabeth não quer ser poupada. As brincadeiras de amigos como Charlotte Lucas é exatamente do que ela precisa no momento. Transformando o fora de Mr. Darcy em piada, ela está negando a dor que isso certamente lhe causou e também está buscando o apoio e a simpatia de seu grupo. Fazendo com que riam com ela da arrogância de Mr. Darcy, ela está recebendo a confirmação de que o problema não é sua beleza e sim a pouca vontade dele em ser agradável. O riso a permite controlar e redefinir a situação.
O poder que o riso dá à Elizabeth é mostrado mais a frente quando, muito depois, em Rosings, ela usa o incidente como um exemplo das coisas “chocantes” que ela pode revelar sobre Mr. Darcy. “Prepare-se para ouvir algo horrível,” diz ela em tom divertido para o Coronel Fitzwilliam. “A primeira vez que o vi (Mr. Darcy) foi em um baile em Hertfordshire – E nesse baile, adivinhe só o que ele fez? Dançou somente quatro danças! Sinto muito te causar uma desilusão – mas foi isso mesmo. Ele dançou só quatro danças embora faltassem cavalheiros; e pelo o que eu sei, mais de uma jovem dama ficou sentada a espera de um par”
Ao brincar sobre as poucas vezes que Mr. Darcy dançou no baile de Meryton, Elizabeth está se aproximando do Coronel Fitzwilliam, pedindo implicitamente a sua validação sobre a idéia de que o errado era o seu primo. Entretanto, também está rindo de si própria e das outras mulheres que queriam a oportunidade de dançar, mas não puderam por falta de parceiros. Além disso, ela toca nesse assunto durante uma conversa que inclui Mr. Darcy, dando a ele a oportunidade de rirem juntos da situação já que nenhum dos dois estava em vantagem. Mesmo que de forma inconsciente, ela esteja se aproximando dele também.
Esse diálogo em Rosings é essencial para história e embora Elizabeth não perceba a importância de seu significado, fica ilustrada ao leitor a curiosa harmonia de pensamento que se desenvolveu entre Darcy e ela. Ao se passar antes da infame primeira proposta de casamento, ele antecipa o entendimento perfeito entre os dois que só veremos novamente depois da segunda proposta.
A conversa entre eles começa com Elizabeth, em tom de brincadeira (mas sincera em até certo ponto), o acusando de tentar intimidá-la ao “se aproximar com toda essa imponência” para ouvi-la tocar. Ele entende a brincadeira, mas demonstra dúvida sobre o que ela quis dizer: “Você não acharia realmente que eu tenho qualquer desejo em alarmá-la.” Ele sugere que ela está, de fato, brincando. “Tenho o prazer de conhecê-la tempo o bastante para saber que se diverte em exprimir opiniões que na verdade não são as suas”. Quando ela ameaça contar ao Coronel Fitzwilliam sobre seu comportamento em Hertfordshire, Darcy a desafia respondendo: “Não tenho medo de você”. Nesse momento ele está sorrindo.
Como dito anteriormente, os sorrisos de Mr. Darcy são tão importantes quanto o riso de Elizabeth, pois eles indicam o prazer que ele encontra na sua companhia e em sua conversa. Eles também refletem o quão atraído ele se sente por ela. Podemos entender que o “eu não tenho medo de você” é uma resposta ao que foi dito por Elizabeth em outra ocasião: “de mim você está a salvo.” A essa altura da história, Darcy começou a se mostrar receptivo ao riso de Elizabeth, identificando tanto a atração sexual quanto o convite para amizade.
De forma brilhante, essa cena antecipa uma proximidade entre Darcy e Elizabeth. No início da cena eles se falam diretamente: “Você tentou me assustar”, ela acusa. “Você não acharia realmente que eu tenho qualquer desejo em alarmá-la,” ele responde. Mas no fim da conversa, quando Darcy diz a ela: “Você empregou seu tempo de forma muito melhor. Ninguém que tenha tido o privilégio de ouvi-la, pode achar que lhe falta algo. Nenhum de nós dois se apresenta para estranhos”, eles estavam falando metaforicamente. Elizabeth fez uma analogia entre a habilidade de tocar piano e a habilidade verbal, social que Darcy admite lhe faltar. Ele aceita a analogia – que vem junto com o riso – e a inverte, assim ao invés de mostrar a diferença entre eles (ela é boa em se relacionar e conversar enquanto ele não o é), o foco vai para as semelhanças que ele vem a reconhecer.
Num dialogo anterior, no baile de Netherfield, Elizabeth diz à Mr. Darcy, “Vejo que há uma grande semelhança em nossas personalidades”. Ela completa que ambos têm um feitio “anti-social, taciturno”. Apesar de estar sendo irônica nesse momento, ela estava mais certa do que podia imaginar. O pensamento rápido de Elizabeth e sua perspicácia se igualam com a inteligência de Mr. Darcy, embora isso não aconteça em relação a sua naturalidade.
É essa grande semelhança de pensamento que torna o relacionamento entre eles tão excitante. “Nenhum de nós dois se apresenta para estranhos” é o jeito que Darcy encontra para dizer a Elizabeth que ele pode ver o seu íntimo encoberto pela inteligência verbal que ela expressa, e que assim ele é capaz de admirá-la como “estranhos” não fariam. Ao mesmo tempo ele sugere que nele também há mais do que se pode ver superficialmente e afirma um reconhecimento de semelhanças entre eles que a própria Elizabeth ainda não havia descoberto. É um convite para intimidade.
Esse diálogo não resulta numa maior intimidade, pois ambos ainda têm muito que aprenderem sobre si mesmos. Somente depois da confrontação da primeira proposta de Darcy e de sua carta onde explicava os detalhes de seu relacionamento com Wickham é que ele e Elizabeth podem se unir como iguais que são. Darcy tem que admitir a si próprio que seu orgulho tem sido arrogante e pouco cavalheiresco; Elizabeth tem que reconhecer que errou em seu julgamento e que fez mau uso de sua perspicácia. “Quis ser tão esperta ao tomar partido tão decididamente contra ele, sem nenhuma razão,” ela admite para Jane. “Uma antipatia deste tipo é um grande incentivo para o ego e uma porta aberta para perspicácia. Pode-se falar mal de alguém por muito tempo sem dizer nada de justo; mas não se pode rir sempre de um homem sem de vez em quando tropeçar em algo espirituoso.”
Todo esse auto conhecimento seria irrelevante sem a forte atração sexual e o crescente senso de harmonia sugerido em situações como a de Rosings. A batalha de inteligência entre herói e heroína pode ser vista como um tipo de “preliminar”. No mundo da comédia romântica, o riso reafirma a vida e promete gratificação sexual. Como uma heroína virginal do inicio do século XIX, Elizabeth não está ciente do sentido sexual do riso – o seu foco consciente é a amizade e a união – mas a união sexual em potencial, implícita em seu riso, fica subjacente em grande parte de sua interação com Darcy.
Quando Elizabeth diz a si mesma que Mr. Darcy “ainda não aprendera a aceitar que rissem dele” ela está na expectativa da chegada de uma intimidade muito maior, como ela reconhece “era ainda cedo para começar”. A chegada do momento em que se poderia rir de Mr. Darcy está ligada à intimidade do casamento. A explicação dada por Elizabeth para sua jovem cunhada de que “uma esposa pode se permitir algumas liberdades com o marido que um irmão nem sempre poderia tolerar de uma irmã mais de dez anos mais jovem do que ele”, não apenas nos mostra que Elizabeth tem tido sucesso em ensinar Mr. Darcy a aceitar o riso, mas também mostra o contexto em que ele se encontra. As “liberdades” verbais de uma esposa estão sugestivamente ligadas as “liberdades” físicas do matrimônio. Deste modo, no fim, rir de Mr.Darcy passa a ser uma maneira de fazer amor.
Muito obrigada pela tradução(meu inglês inexistente agradece). Assim como você eu também me irmano a Elizabeth sempre contei minhas desgraças para meus amigos de forma divertida. Meu lema sempre foi ''antes de rirem de mim, riam comigo''.
ResponderExcluirFico feliz que tenha gostado e que a minha tradução lhe tenha sido útil.
ResponderExcluirMuito obrigada pelo comentário! Isso me incentiva bastante! ^______^
beijosss
Nossa eu adoro essas análises, desvendam mais coisas do que a gente já viu no livro, o que acaba deixando a história ainda mais interessante né!
ResponderExcluirObrigada pela tradução Lina, eu também jamais teria acesso com o inglês precário que tenho xD